terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Rede Natura 2000 em Albergaria

 photo ria.jpg



O Concelho de Albergaria-a-Velha é um dos poucos do país a poder orgulhar-se de possuir, simultaneamente, áreas protegidas pelas duas Directivas Comunitárias da Rede Natura. A mais significativa, pela sua extensão e biodiversidade, é a Zona de Protecção Especial (ZPE) da Ria de Aveiro, com cerca de 51 mil ha (30 mil de área terrestre e 21 mil de área marinha), dos quais cerca de 5% se situam em Angeja, Frossos, São João de Loure e Alquerubim, correspondendo a 13% do território do Concelho. A paisagem da ZPE da Ria de Aveiro é dominada por extensas áreas de sapal, salinas, áreas significativas de caniço e de bocage associadas à actividade agrícola, que constituem um local privilegiado de alimentação e reprodução de 173 espécies de aves. Esta área, que alberga sazonalmente cerca de 20 mil aves, das quais se destacam o Alfaiate e 60% da população nidificante em Portugal da Garça-vermelha, encontra-se, no entanto, sob ameaças diversas que colocam em risco o ecossistema da região, nomeadamente a drenagem de zonas húmidas para utilização agrícola, o abandono e/ou conversão de salinas em aquacultura, a actividade turística, as dragagens efectuadas pelo porto de Aveiro e a contaminação da água, em particular dos aquíferos.
             
Albergaria-a-Velha tem ainda 2% do seu território classificados como Zona Especial de Conservação (ZEC), nas Freguesias de Vale Maior e Alquerubim. Esta área, de 242 ha, corresponde a 9% da ZEC do Rio Vouga (2.769 ha). A montante, na parte que se situa em Vale Maior, o vale encaixado do Vouga conserva uma extensa galeria ripícola; já a jusante, em Alquerubim, o vale do rio espraia-se na planície aluvial, com a degradação da vegetação ripícola sob pressão da atividade agrícola. O estatuto de conservação destas áreas procura salvaguardar determinados habitats, entre os quais merecem destaque algumas manchas de Freixo, Carvalho-Roble e Ulmeiro, embora seja no próprio rio que se encontre uma maior biodiversidade, pela presença de espécies migradoras como o Sável e a Savelha, ou a Lampreia, a Lontra e a Salamandra-Lusitânica, uma espécie endémica da Península Ibérica ameaçada pela intensificação da agricultura, pela monocultura do Eucalipto e pela alteração da qualidade da água.        

A gestão desta biodiversidade, além de uma responsabilidade, constitui um desafio para o ordenamento do território, particularmente para as Autarquias. Além da articulação com os organismos da administração central e regional nas áreas do ambiente e do turismo e de pequenas obras de conservação/valorização, as Autarquias devem promover uma política de educação ambiental, junto da população em geral e sobretudo nas escolas, de modo a fortalecer o elo afectivo com o património natural existente no Concelho, assim como junto de todos aqueles que desenvolvem a sua actividade económica em área de Rede Natura, no sentido de os elucidar sobre as melhores práticas que promovam a gestão económica, social e ambiental sustentável das áreas protegidas.

Através de uma estratégia de marketing territorial concertada à escala supramunicipal, as Autarquias da região de Aveiro poderão apostar na promoção da Ria como marca de excelência, capaz de promover as cidades e a região. A gestão supramunicipal da Ria deverá incidir na valorização do espaço natural, na sua promoção como espaço com elevada qualidade de vida e criar as condições para que a região seja mais competitiva em determinados nichos de mercado com elevado potencial de crescimento, como o turismo slow city, o turismo de saúde, desportos náuticos e radicais, birdwatching ou pedestrianismo, com uma consequente diversificação das atividades económicas e de emprego.
            
Por último, cabe às Autarquias a responsabilidade de proteger a Rede Natura, através dos instrumentos de gestão territorial, dos ataques especulativos imobiliários. Além dos inúmeros projetos privados que colidem com a Rede Natura, muitos deles verdadeiros casos de polícia, verifica-se que a maioria das Autarquias se tem demitido completamente das suas responsabilidades, já que sobejam exemplos de projetos promovidos, em área de Rede Natura, pelas entidades públicas, as mesmas que, teoricamente, deveriam zelar por um espaço que é de todos. Assim, enquanto cidadãos, deveremos ser mais ativos no processo de monitorização da gestão das áreas protegidas que, por direito, são de todos nós.

in Correio de Albergaria, nº 11 da III Série, 23 de Janeiro de 2013

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Plano Estratégico para o Futuro

O planeamento estratégico constitui, em particular após a intensificação do processo de globalização, uma engrenagem fundamental no desenvolvimento e modernização da organização empresarial. A volatilidade dos mercados internacionais, a dinâmica da procura e a aceleração das fases de comercialização de um produto ou serviço, levaram as empresas a implementar estratégias que permitissem responder da melhor forma e com a maior celeridade possível a estas novas condicionantes. O planeamento estratégico pode ser entendido como um processo de gestão contínuo que envolve a consulta, a negociação e a análise, num processo cíclico de avaliação e diálogo, que pretende retirar partido das potencialidades existentes, regulando os processos em vez de, simplesmente, definir rigorosamente os resultados.

A globalização, além de colocar novos desafios às empresas, alterou de forma substancial os processos de produção do espaço e a forma como este se organiza e regula, num quadro competitivo cada vez mais hierárquico e global. O processo de aplicação do planeamento estratégico empresarial ao planeamento urbano e territorial não procura ser executado de forma directa, porque os objectivos, opções, estruturas e recursos são bastante diferentes. No entanto, a teoria estratégica confere uma nova dimensão ao conceito de cidade e sistema urbano. Tal como as empresas, as cidades também actuam num sistema competitivo global, competindo com outras cidades pelos melhores serviços, mercados, equipamentos, infra-estruturas mas, sobretudo, pelos melhores recursos humanos, mais qualificados, mais criativos e mais empreendedores. O planeamento estratégico procura ser uma plataforma que contribua para o desenvolvimento de um território mais competitivo, ao promover um urbanismo estratégico que articule as ambições a longo prazo e a gestão quotidiana, o global e o local, o geral e o particular, tanto de iniciativa privada como dos poderes públicos.

As mudanças ocorridas na sociedade pós-industrial, em resultado do aumento da mobilidade, da difusão das TIC e da crescente diversidade de actores, institucionais, políticos e económicos, alguns deles supranacionais, colocaram os territórios num contexto de competitividade à escala planetária, que originou, consequentemente, novos problemas sócio urbanísticos, em particular nas cidades. A resolução destes novos problemas implica a adopção de novas estratégias e novas soluções para adequar a resposta dos sistemas urbanos e territoriais à nova ordem mundial, que deverá sustentar-se em pilares fundamentais, como  são a competitividade, a resiliência, a inovação, a coesão e a sustentabilidade. O planeamento tradicional, de cariz normativo, rígido e regulador, não consegue responder com a flexibilidade e pragmatismo exigidos pelas novas solicitações do planeamento territorial, pois limita os planos a meros instrumentos de regulamentação administrativa, visando apenas o controle das iniciativas privadas. Assim, o novo processo de planeamento estratégico introduz uma abordagem mais dinâmica e interactiva que os anteriores planos estáticos e burocráticos, deixa de ser um processo dinamizado apenas por decisores e executantes, mas também e acima de tudo, pelo conjunto dos actores, activos e passivos, presentes no território, através de uma maior participação da comunidade e do seu tecido empresarial, de modo a constituírem-se como uma ferramenta importante de diagnóstico dos problemas e de formulação de objectivos, que permitam tomar decisões em torno de projectos estruturantes e sustentados.

O planeamento estratégico afigura-se como um instrumento ao serviço das cidades, com o intuito de produzir externalidades que promovam a competitividade, não se limitando à repartição e zonamento do espaço urbano. Nesta abordagem, o planeamento físico perde a primazia no processo de planeamento estratégico, que recai na valorização dos factores endógenos e na capacidade de gerar processos de inovação, procurando resolver os problemas e constrangimentos identificados, focando-se em objectivos e critérios mais qualitativos, de ordem cultural, social, económica, de qualidade de vida e sustentabilidade ecológica. O planeamento estratégico não pretende substituir os instrumentos de gestão territorial em vigor, mas incluir estes no conceito de planeamento em geral, que integrará o ponto de vista socioeconómico (caracterizado pela flexibilidade no curto prazo) e o biofísico (que se pauta por operações até ao longo e muito longo prazo). 

O planeamento estratégico constitui uma oportunidade para os lugares se pensarem e posicionarem num contexto dinâmico de mudança. Uma oportunidade ainda inexplorada pelo Concelho de Albergaria-a-Velha, que se encontra em fase final de revisão do seu Plano Director Municipal. Um Plano Estratégico de Albergaria, promovido e dinamizado pela Autarquia, poderia funcionar como uma plataforma de diálogo e entendimento entre os diversos agentes e a comunidade, de forma a avaliar as forças e debilidades existentes no território, os objectivos a atingir e escolher os meios e instrumentos disponíveis, entre os quais os planos de gestão territorial em vigor, para alcançar os objectivos propostos. Estes passariam pela concretização de programas estratégicos integrados, escalonados temporalmente no curto, médio e longo prazo, dinamizados após a negociação entre o poder político, entidades privadas ou institucionais e a comunidade. Os novos desafios que o nosso Concelho enfrenta apenas serão ultrapassados se os planos territoriais forem acompanhados por uma abordagem prospectiva, uma cultura de avaliação e uma gestão estratégica participada e pragmática. A eficácia desta abordagem deverá conduzir a uma valorização do território, tornando-o mais dinâmico, social e economicamente, mais coeso, criativo, inovador e competitivo, numa base de sustentabilidade.


A participação da comunidade no processo de planeamento conduzirá à sua democratização, a uma maior identificação dos indivíduos com o seu território, com os problemas que o afectam e as soluções possíveis, através de uma renegociação e monitorização permanente entre todos os envolvidos, num processo de aprendizagem colectiva. 


in Correio de Albergaria, nº 9 da III Série, 19 de Dezembro de 2012